Que nem limão

Que nem limão

terça-feira, 30 de setembro de 2014

Rearranjos.

Sexta feira é meu aniversário. E na sexta feira eu faço trinta anos e tô fazendo o maior drama por causa disso. Não, não penso que trinta anos sejam tantos anos. Não, não me sinto realmente velha. O que sinto é como se num intervalo inalcançável a minha infância tivesse escapado de mim. 

Não tenho grandes saudosismos, nem da infância. Coleciono algumas saudades daquele tempo mas lembro também de ser uma criança angustiada, uma criança que não dormia, que fazia xixi na cama, incrivelmente tímida. Uma criança quieta, definiu minha irmã do meio. E eu era mesmo muito quieta. E eu era mesmo capaz de ficar horas dentro de um quarto sem conversar, porque ler já era muito bom. E eu brincava sozinha e inventava histórias dramáticas desde então.

Não gostava muito de ir à escola mas que me conformava. Achava as aulas chatas e não gostava muito de estudar, mas estudava. Acho que comecei a ser professora nessa época, com uns oito ou nove anos. No geral eu não tinha tantas dificuldades e aí ajudava uma amiga que tinha mais. E eu explicava pra ela e fazia as tarefas junto. A escola tinha as partes boas...as amigas que me ajudaram a ser uma criança menos quieta. Mas eu sempre tive a sensação de que ninguém me via. As pessoas viam as minhas amigas que eram bonitas e sabiam jogar vôlei e sabiam matar no caçador (eu só sabia me defender). Eu me senti invisível a maior parte da minha infância. Nem bullying eu sofri.

Acho que só deixei de ser invisível quando um dia me contaram que eu sabia escrever. Eu tinha catorze anos. E foi uma baita notícia! Foi quando comecei a querer escrever pra viver, queria ser jornalista, e minha irmã mais velha (que nessa altura do campeonato já era jornalista) me contou que eu poderia escrever fazendo qualquer coisa. E era verdade. Ler e escrever: não fico sem.

Pensando na minha vida desde essa época em que comecei a me definir como quem eu seria quando eu crescesse, chego a conclusão de que nunca foi muito simples. Nunca foi uma linha reta, a+b. Aliás, eu poderia dizer que a vida é, na melhor das hipóteses, uma equação de segundo grau. Mas existem as de terceiro, quarto, infinitos graus. E agora, às vésperas de completar trinta anos eu concluo duas coisas:

1) Coisas inesperadas acontecem sempre para mim e as pessoas ao meu redor já estão acostumadas com isso e também já perceberam. Às vezes elas fazem comentários do tipo: "Ge, já reparou como a sua vida tá sempre mudando?". E eu tenho que responder que sim, reparo sempre. E tenho uma frase pra isso: a vida que me vive. Entendi isso não faz muito tempo. Foi logo que me formei.

2) Eu tenho muita sorte. Meu namorado me diz que eu não sofri muito na vida. E ele tem razão. Não consigo localizar um episódio em que eu tivesse pensado que não teria como resolver, ou quem me ajudasse a resolver (nem que a ajuda significasse estar perto). Uma amiga mais espiritualizada disse que eu sou abençoada. Há quem diga que nasci virada pra lua. Tudo é válido.

Então, como a minha vida tá sempre mudando, de tão acostumada, quando a mudança aparece, nem me surpreendo mais. O drama é pequeno nessa área, pelo menos em alguma tinha que ser. A mudança é tão familiar que já abre a porta da geladeira e pega uma cerveja enquanto espera quanto tempo eu vou levar pra reunir minhas tralhas subjetivas para a próxima fase. Acho que esses meu começo de nova década promete um rearranjo dos grandes. Tô feliz em ter trinta anos. Mas me sinto uma criança brincando de pagar as contas.

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